Quando estudava na FEI, fui presidente do Centro de Estudos de Eletricidade (CEE). Apesar do nome pomposo, era apenas uma sala de cerca de 12 metros quadrados, mal ventilada, onde nos reuníamos para discutir filosofia, política, futebol, dormir, jogar truco e (raramente) estudar.
Numa das longas tardes, numa "janela" entre duas aulas, encontrei meu colega Estéfano e começamos a conversar uma típica conversa "de jogar fora".
Entre um comentário e outro pulamos de futebol para a comida horrível do restaurante, pelas finanças do CEE, sobre o movimento estudantil e finalmente fomos parar na matemática. Talvez porque dali alguns diasteríamos prova de Cálculo Diferencial e entre os assuntos estavam os números complexos.
Para quem não se lembra, um número complexo é composto pela soma de um número real com um número imaginário. O número imaginário é a raiz quadrada de um número negativo.
Os números complexos são um dos terrores dos estudantes, em especial do curso secundário, justamente por não estar associado ao mundo real (ele tem um componente "imaginário").
Num determinado momento de nossa conversa, Estéfano contou-me:
— Você sabia que há mais ou menos um ano, eu, por brincadeira inventei o número kapsilon?
— Kapi o que?
— Kapisilon. O resultado de uma divisão de um número real por zero.
Todos tínhamos aprendido que dividir um número por zero era impossível. Mas como Estéfano lembrou, a raiz de um número negativo também. Ele então continuou:
casa invertida (divisão por zero)
— Não só isso, criei a teoria completa...
— E o que você fez com ela?
— Levei para o Departamento de Matemática.
— E o que eles disseram?
— Ficaram com meu trabalho uma semana e me devolveram dizendo "tentamos encontrar alguma inconsistência no que você fez e não achamos!"
— E então?
— Eles falaram: "Leve isso daqui e enterre! Se os alunos descobrirem que terão que estudar mais um conjunto, vão querer matar você!"
Nesse instante, meus olhos brilharam: era uma chance de nós, ou pelo menos meu amigo, ficarmos famosos!
— Você ainda tem essa teoria?
— Tenho!
Pronto, estava iniciada a nossa saga, pensei. Contei pra ele o meu desejo e de minha disposição em ajudá-lo a elaborar toda a demonstração. Ele aceitou prontamente, pois apesar de ser criativo, não estava muito disposto a suar em cima.
Ao chegar em casa, juntei todo o material que tinha e com alguma grana economizada, comprei alguns livros. O trabalho nos consumiu algumas de nossas poucas horas de folga, durante alguns meses.
Ampliei a teoria para considerar não só um número real como um número complexo divididos por zero. Tentamos colocar este mundo dentro do universo que conhecíamos da matemática e da lógica.
Num determinado momento empacamos numa questão: o que fazer quando um número kapsilon fosse dividido por zero?
Começamos a elaborar hipóteses, mas não conseguíamos fechar com coerência e não queríamos simplesmente interditar a divisão por zero para um número kapsilon.
Iniciamos então nova pesquisa, desta vez em bibliotecas universitárias. Pesquisa daqui, pesquisa dali e topamos com os quaterniões.
Sir William Rowan Hamilton
Esses números foram inventados em 1843 por um matemático chamado Hamilton. Sua teoria era bastante similar à nossa proposta e serviu de base para a Mecânica Quântica.
Estávamos mais de um século atrasados...
PS.: Hamilton se tornou alcoólatra após a morte da esposa. A lenda conta que ele criou a teoria dos quaterniões após um pileque, escrevendo-a num banco de jardim.
Eu tinha ouvido falar dessa história, mas eu não lembrava quem a tinha contado! Acho que vi numa lista de FC =) Bom, você e seu amigo podiam tentar demonstrar a hipótese de Riemann... =P
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