Assembléia Estelar
Organizador: Marcello Simão Branco
Editora: Devir
Ano: 2010
400 páginas
Errata: Por um descuido subi o arquivo errado e dois
contos ficaram de fora, A Era de Aquario, de Miguel Carqueija e O Grande
Rio, de Flávio Medeiros. Peço
desculpas aos autores e aos leitores pelo descuido. Os contos estão posicionados
agora como os dois primeiros da lista.
Sinopse: Coletânea da coleção Pulsar,
onde a temática e Política e Ficção Científica. São 14 contos, mesclando
autores brasileiros e estrangeiros, que traçam um panorama bem amplo das formas de ver a política dentro de diversos cenários futuros. Os contos são
precedidos por um bom ensaio assinado por Marcello Simão Branco, Afinidades eletivas entre Ficção Científica e Política, que consegue ser preciso e
detalhado, sem aborrecer o leitor.
Todos os textos vêm
com uma breve biografia do autor, procurando contextualizar o conto dentro de
sua obra, bem como no pano de fundo mais amplo da Ficção Científica e da Política.
O organizador procurou
não polarizar ideologicamente sua seleção, embora haja uma predominância da
visão distópica nos contos.
A Era de
Aquário - Miguel Carqueija
Num futuro
próximo, um senador irá dar uma palestra em uma universidade e há uma
preocupação com possíveis atentados. Uma ironia profunda norteia o conto, principalmente
em relação ao discurso do senador. Muito bom.
O Grande Rio – Flávio Medeiros
Um viajante
do tempo, de época futura, tenta assassinar o Presidente Kennedy, pois este
acontecimento vai evitar uma série de fatos catastróficos. Medeiros consegue
duas façanhas: inovar em uma história que já foi usada muitas vezes até em viagens
no tempo, colocando a perspectiva de que o assassinato tem que acontecer. Outro ponto é conseguir criar suspense em uma
história em que já sabemos o final. O autor demonstra também um bom
conhecimento dos fatos e das especulações em torno do assassinato, conseguindo
amarrar perfeitamente a presença do viajante no evento. Excelente.
A Queda de Roma, Antes da Telenovela – Luís Filipe Silva
Um político
de velha guarda (ou seja, que gosta do jogo político de alianças e discursos
inflamados) não consegue se adaptar aos novos tempos onde a participação
popular via internet nas decisões é fundamental. O autor se concentra em
explorar os sentimentos do velho político ante algo que não consegue assimilar.
Muito bem construído.
Anauê – Roberval Barcellos
O conto
retrata uma realidade alternativa onde os Nazistas ganharam a Segunda Guerra e
farão uma visita ao Brasil (seu aliado), governado pelos integralistas. Uma boa
trama, com direito a revoltas, reviravoltas e confrontos políticos e militares.
Personagens, trama e caracterização da realidade alternativa bem criados.
Gabinete Blindado – André Carneiro
Uma mulher
imersa num atentado terrorista descreve o que sente e vê, misturando com suas
lembranças. A narrativa fragmentada e tensa em primeira pessoa aumenta a
dramaticidade do que está acontecendo, fazendo leitor mergulhar de cabeça na
cena descrita. Excelente!
Trunfo de Campanha – Roberto Causo
Um conto divertido
e competente de Causo, porém meio morno quando comparamos com outros textos do
autor e principalmente onde há a participação de Peregrino, um pouco longe de
seu “habitat” (batalhas espaciais). Aqui o inimigo de Peregrino é bem mais
sutil e por isso mais danoso. O militar está prestes a ser usado por um
político inescrupuloso como um “trunfo de campanha” (já denuncia o título).
Será que Peregrino, habituado a outro tipo de batalha, conseguirá se sair
dessa? A sensação que eu tive deve ser a mesma do personagem: é melhor e mais
divertido lutar contra os alienígenas.
Diário do cerco de Nova York – Daniel Fresnot
Escrito na
forma de um diário, o livro conta a história de uma revolta dos cidadãos de Nova
York, liderados por um político carismático, contra a União. O
personagem-narrador é um escritor francês e sua família, que resolvem ficar
mesmo tendo percebido os riscos. Um enredo onde uma pessoa comum é colocada
numa situação incomum. O personagem é um estrangeiro e portanto despolarizado
em relação a luta que testemunha. O texto então se concentra no drama pessoal
do personagem, reflexo do drama que a cidade vive. Um conto excelente.
Saara Gardens – Ataíde Tartari
Uma disputa
política entre duas facções de políticos, uma a favor da recuperação de um
deserto e outra contra, se enfrentam no palanque e fora dele, às vezes
valendo-se de táticas não muito honestas. O humor de Tartari, que inverte
alguns paradigmas (desde o título) e cria alguns personagens caricatos, torna o
conto muito divertido.
A Evolução dos Homens sem pernas – Fernado Bonassi
Aqui também
aparece o humor, de forma caústica e cínica. Soluções em busca de necessidades
acabam criando um ambiente onde estas necessidades acabam por se tornar reais.
Uma boa alegoria.
A pedra que canta – Henrique Flory
Conto que tem como pano de fundo a ditadura militar presente em vários países da América do Sul. O
contexto é uma guerra entre Brasil e Argentina e o uso da Usina de Itaipu como
uma arma. Uma criança com um problema ósseo é na realidade o gatilho. Apesar de
datado, ainda assim emociona, sobretudo por estar centrado na criança e nas
formas que tentaram usar para manipulá-la.
O dia antes da revolução – Ursula K. L. Guin
Outro conto
narrado de forma fragmentária. Ele se fixa na história de uma líder
revolucionária, mostrando vários aspectos de sua vida, do seu cotidiano e de
sua luta. A força do texto está no desvendamento paulatino da personagem que
revela sua grandeza de várias formas. Excelente.
O Originista – Orson Scott Gard
Criado
dentro do universo de Fundação, como parte de um tributo ao clássico de Isaac
Asimov esta noveleta é uma das melhores histórias desta coletânea. O Universo é
muito bem explorado e faz uma crítica feroz ao academicismo medíocre que não gera
conhecimentos novos, apenas reagrupa o que já foi escrito sobre o assunto . O
Originista do conto é Level Forska, alguém que foi “recusado” a participar da Primeira
Fundação justamente por não ser capaz de ordenar conhecimentos, mas de criá-los
(o que justifica o título). Aconselha-se aos que não leram Fundação e desejam
ler, pular este conto, pois ele é um enorme spoiler para um dos eventos mais importantes da saga.
Questão de sobrevivência – Carlos Orsi
Um
revolucionário envolvido numa luta de classes, questiona-se o tempo todo sobre
valores éticos. O ambiente é um Brasil distópico, governado por uma ditadura de
extrema direita. Trata-se de um bom exemplo de narrativa “tupinipunk”. Texto muito bem conduzido, com um final que
surpreende, mostrando um novo ângulo do personagem principal e a razão maior
dos seus questionamentos.
Vemos as coisa de modo diferente – Bruce Sterling
Num futuro próximo, em um Estados Unidos decadente, mas ainda forte, um jornalista árabe entrevista um astro de
Rock. Haveria possibilidade das duas
culturas superarem suas diferenças? O clima de tensão controlada e, por fim, de distenção acende uma esperança no leitor? Isso se
manterá? Um final que parece um soco no estômago.