quarta-feira, 17 de março de 2010

A Ciencia desvairada dos Nazistas

George Orwell, em seu 1984, coloca uma forma de pensar dos membros de O Partido, da qual o duplipensar era parte integrante. A estrutura filosófica imaginada por Orwell, apesar da criatividade de seu autor, não veio do nada. O autor de 1984 inspirou-se na filosofia e na ciência nazistas. 




Quem leu o livro pode simplesmente ter pensado que seria altamente improvável alguém ser tão louco a ponto de achar que aquela filosofia pudesse ser verdadeira. Afinal, era apenas ficção. Entretanto, na Alemanha nazista, os ideólogos do partido criaram um corpo de ideias que parece ter saído do diário de um lunático. E essa ideologia foi adotada por um grande grupo de pessoas, inclusive cientistas de renome. 


Não estou falando aqui das teorias racistas nem das cobaias humanas. Estou falando da física, em especial da cosmologia.


Segundo Jaques Bergier, no seu livro O Despertar do Mágicos, um dia Hitler convocou sua equipe para que se encontrasse uma teoria de base científica sobre a qual se pudesse construir uma nova ciência, livre dos paradigmas da ciência ocidental. 



Isso seria possível, pois se levarmos em conta o pensamento de Thomas Khunn, só podemos construir um conhecimento através de modelos aproximados da realidade. Construímos uma teoria que poderá ser valida até que um fato ou um experimento crucial a desminta. Somos também baseados numa tradição. Uma nova teoria deve explicar tão bem o mundo quanto a teoria que ela derrubou. Por exemplo, a Teoria da Relatividade explica também o movimento de um trem, tal qual a Teoria de Newton. O paradigma de Newton continua sendo válido para um mundo mais restrito. 


O que Hitler desejava era desprezar esta tradição, criando uma do zero.
Bergier nos conta que Hitler teria dito:


– A Nova Ciência não precisa ser verdadeira, basta ser convincente. 



A primeira candidata foi a Teoria da Terra Oca. Segundo esta teoria, nos não vivemos no lado de fora da crosta terrestre, mas sim no seu lado de dentro. A gravidade seria a força centrifuga que nos manteria afastado do centro. O que víamos como céu seria uma ilusão. 




Os nazistas chegaram a fazer um experimento para provar isso. Um navio colocado em uma posição da calota poderia receber um sinal de luz de um colocado no extremo oposto.
É claro que a experiência fracassou e o pobre do criador da teoria foi parar num campo de concentração.


Chegou a vez de Hans Horbiger, que criou uma cosmogonia baseada no seguinte princípio: o universo é formado por dois princípios, fogo e gelo, que estão em eterna luta (como nas tradições Vikings, outra coisa que Hitler queria ressucitar). Essa luta determina a vida e a morte do universo, num eterno renascimento. 


 Hans Horbiger


Outro ponto de sua teoria é que nossa lua representaria o gelo, e um dia cairia sobre a Terra. Esta seria a quarta lua. Outras três já teriam caído sobre a Terra, causando a conformação da Terra como a conhecemos hoje.


A órbita do nosso satélite na realidade seria um espiral, que a cada volta da lua a aproximaria mais e mais até que um dia haveria o colapso fazendo-a cair sobre nós. Antes, contudo, haveria diversas catástrofes causadas pelas marés. Por outro lado a presença da lua alteraria o DNA dos animais e plantas, fazendo surgirem novas espécies. O ser humano também sofreria uma mutação, tornando-se mais forte, para resistir aos cataclismas. A término no processo, haveria uma raça forte pronta para herdar a Terra. Finalmente, o satélite iria se fragmentar em pedaços deixando a Terra circundada por um anel.


A raça humana que vive na Terra seria formada por herdeiros de vários estágios pelos quais a Terra passou. A civilização judaico-cristã, que hoje habita a maior parte, teria perdido contato com seu passado glorioso. Caberia à chamada raça ariana o resgate deste passado. Eles são portadores do fogo, e apenas eles poderão derrotar o gelo.



Esse é um resumo bem simples da teoria de Horbirger. O povo alemão tinha aulas desta filosofia pelo rádio. Isso era ensinado nas escolas e era cobrado dos cientistas um compromisso de aceitarem como verdade os seus dogmas. Horbirger era aclamado como um novo Copérnico.

Como um povo inteiro pôde acreditar numa teoria destas? Em primeiro lugar, todo este discurso, como toda a filosofia nazista era propagada de forma emocional, com ênfase no "povo alemão que venceria o gelo". Outro fator, é que ela é centrada na cosmogonia, algo bem distante na vida prática do cidadão comum, ou mesmo de um cientista de outro ramo do conhecimento. Não é muito diferente do big-bang, por exemplo. Ou seja, tanto faz se ocorreu ou não o big-bang, que o sol brilhará amanhã e a equação da fotossíntese continuará igual. Bem diferente da Terra Oca, da forma como foi proposta, onde uma simples viagem de navio a tornaria difícil de engolir.


A teoria funcionou muito bem para dar consistência e coerência a outros pontos do discurso nazista, porém foi uma das responsáveis pela derrota dos alemães na Segunda Guerra Mundial.


Boa parte dos analistas aponta a invasão da Rússia no inverno como uma das principais causas da derrota nazista. No entanto, mais do que seu exército foi derrotado: toda uma população que acreditava na vitória do fogo sobre o gelo perdeu qualquer esperança. Qualquer discurso, a partir de então, não faria o mesmo efeito. Sem contar o fato de que há uma forte probabilidade de Hitler ter tomado esta decisão para simplesmente reforçar as teorias de Horbiger! Não que ele realmente acreditasse em tamanha bobagem, mas ele acreditava realmente na superioridade de seu exército em qualquer circunstância.


George Orwell pegou ainda um outro aspecto da filosofia de Horbiger. Os cientistas comprometidos com o nazismo tinham que lidar com um conflito de ideias difícil de conciliar. A maneira era separar no cérebro, em compartimentos estanques, as duas formas de pensar, usando ora uma, ora outra, conforme a necessidade. Não se trata de simples hipocrisia, pois ao assumir cada um dos lados, o cientista realmente acreditava naquilo, como em 1984.


Mas e você? Realmente acredita em tudo isso ou está duplipensando?

2 comentários:

  1. Hoje podemos falar em termos de ciência desvairada, como que para dizer que NOSSA ciência atual não é louca como aquela. Mas a ciência atual tem aspectos tão loucos quanto aqueles, porque feita por humanos sujeitos a toda sorte de preconceitos (conceitos formados antes dos fatos e perenes perante os fatos). Por outro lado, na época nazista sabemos que houve ciência exata do ponto de vista estritamente técnico, como o desenvolvimento de foguetes e armas, e o avanço no conhecimento da fisiologia humana e da genética (esse avanço fruto de criminosas experiências, mas, do ponto de vista técnico, são consideradas exatas até hoje).
    Não há ciência pura, não nos enganemos, nem hoje e num nunca, simplesmente porque nós, seres humanos, não somos seres isentos, neutros, sem preferências, ambições e paixões.

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  2. Na verdade, a teoria da "Terra Oca" não dizia que vivíamos dentro da Terra, mas apenas que devido às ações gravitacionais na criação do planeta ele seria oco, como um pote de argila moldado em uma centrífuga. Outra parte da teoria falava do "sol interno" e de possíveis formas de vida que habitavam o interior do planeta. Aliás, basta conferir o desenho que vc usou como referência, a América do Sul está do lado de fora, e do lado de dentro há continentes com formatos diferentes dos que conhecemos.

    Mas desculpe se estou sendo chato, o artigo ficou muito bom, Parabéns!

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