Ficha Técnica
Autor: Bariani Ortêncio
Editora: Kelps
Páginas: 138
Ano: 1996
Sinopse: O Dr. Libério é um medico famoso e pesquisa as técnicas necessárias para um transplante de cérebro. Afetado por um problema neurológico grave orienta sua equipe para ser ele o primeiro paciente. Neste meio tempo, sua esposa tem um caso com Luciano, um corretor de imóveis. Movido pelo ciúme, Libério assassina o rival. Ironicamente, tem um ataque de sua doença neurológica e é encaminhado para ser receptor do cérebro de Luciano.
Bariani Ortêncio é um autor radicado em Goiás, com uma boa aceitação de crítica e público na região, conhecido como autor de ficção policial. Uma das razões para eu me dispor a resenhar este livro é por fugir ao tradicional espaço da FC brasileira, que tem a maioria de autores produzindo em São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
O livro foi escrito nos anos 1970, no momento em o Dr. Zerbini ensaiava as primeiras incursões nos transplantes cardíacos. Esta é a primeira constatação que faço e que poderia dar origem a algum estudo mais aprofundado: quando há ciência em evidência, há ficção científica. Na mesma época, houve uma novela na extinta TV Excelsior, com Carlos Zara no papel principal, tendo como tema um transplante de cérebro.
O livro busca misturar os gêneros policial e ficção científica e está centrado no drama de Luciano, obrigado a habitar o corpo de seu assassino. Aqui temos o ponto forte do livro: Luciano, para os outros, é o Dr. Libério. Não pode sequer se aproximar de sua esposa e filhos, pois para eles, é um estranho. Olha todos os dias no espelho para o rosto de seu algoz. E, para complicar as coisas, ele corre o risco de ser descoberto e condenado por ser o assassino de si mesmo!
O texto é bem escrito, o autor sabe criar suspense e conduzir a narrativa, tornando a leitura interessante.
Atenção: Contém spoiler!
O principal ponto fraco do livro, e que joga por terra todas as boas qualidades, é inverossimilhança. O primeiro ponto: é muito pouco provável que alguém queira ter seu cérebro retirado para dar lugar a outro, ainda que tenha uma doença gravíssima.
O segundo, muito mais forte, é que a equipe do Dr. Libério esperava ter, após o transplante, o Dr. Libério! Eu acho que até o mais estúpido leigo imaginaria que trocando o cérebro, se troca as personalidades!
O terceiro ponto: há ainda a providencial morte num acidente automobilístico de Raul, rival de Luciano, que corteja a esposa do corretor, oficialmente viúva. Um personagem a menos para se preocupar.
E o quarto ponto: o final parece a última cena de “A Tempestade” de Shakespeare, onde todos se redimem de seus males e se reconciliam um com os outros: Luciano com sua esposa, a quem traiu, Libério com a sociedade, já que não há morto e que, graças a uma providência de seu assistente, teve seu cérebro guardado, podendo assumir de volta o corpo. Luciano, logo encontraria outro “receptor” para seu cérebro e Lucinda, esposa de Libério, que finalmente consegue o divórcio em condições vantajosas tendo também seu “perdão”.
Fechando o livro há uma análise acadêmica, do Prof. José Fernandes, da cadeira de Literatura Brasileira da Universidade de Goiânia, inteligentemente colocada num posfácio, já que está recheada de spoilers.
O objetivo desta análise é colocar esta obra dentro do contexto das obras do autor. Ainda que tenha elementos úteis para compreensão da obra, ela está recheada de preconceitos (que ele diz não ter) contra a ficção científica, como se fosse uma literatura menor destinada “ao grande público”. Boa parte da argumentação está em justificar a presença da FC apenas como um recurso literário a mais empregado pelo autor, que já escrevera obras em outro “gênero menor”, segundo o ensaísta, a literatura policial. Ou seja, para José Fernandes, o livro é bom “apesar” de ser um misto de FC com policial.
Um ensaio irritante e desnecessário.
Excelente a resenha do livro. Comnetários com conteúdo e aprofundamento do tema.Literariamente, de muito bom nível.
ResponderExcluirRealmente. Trocar o cérebro do cara e pensar que será a mesma pessoa é dose para elefante.
ResponderExcluirInfelizmente o preconceito entre acadêmicos quanto ficção científica e fantasia é grande. Mas não apenas nessas áreas. Críticos literários tendem a rebaixar tudo que precede os anos 60.
Quer dizer que Frankestein, Drácula, Guerra dos Mundos, Julio Verne, etc, é ruim?
Ótimo post, novamente.
O enredo parece interessante e instigante. Uma pena o autor não haver conseguido a verossimilhança. Fica a idéia, que me parece ótima.
ResponderExcluir