sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Cursed City - Horror e mistério numa cidade do Velho Oeste

Cursed City
Onde as almas não têm valor
Autores: M. D. Amado (org.), Alfer Medeiros, Ghad Arddhu, Carolina Mancini, Cirilo S. Lemos, André Bozzetto Jr., Alliah, Georgette Silen, Verônica Freitas, Tânia Souza, Romeu Martins, Valentina Silva Ferreira, Jota Marques, Ana Cristina Rodrigues, Chico Pascoal, Davi M. Gonzales, Yvis Tomazini, Lucas Rocha,  Zenon. Prefácio: Adriano Siqueira.  
Editora: Estronho
Ano: 2011
236 páginas

Sinopse: A partir de um cenário previamente escolhido e de uma temática que mistura western com terror e horror, vários autores atenderam ao desafio proposto por M. D. Amado. Cursed City, a outrora próspera Golden Valley, é uma cidade onde até o mais valente dos pistoleiros teme sair a noite, pois enfrentará a morte certa e cruel. São sugeridos alguns personagens, como Billy Monstrengo, o dono do Saloon e o apache Hodoken e fixado um período: entre 1845 e 1870.

Impressão geral:

Por reunir autores em vários momentos de suas carreiras, alguns iniciantes outros bem experientes, o resultado é um pouco irregular. Todavia alguns autores iniciantes tiveram boas sacadas e souberam desenvolver bem suas ideias.

Merece destaque a capa (furada “à bala”) e os cartazes de “procura-se” que identificam os autores.

Vamos dar uma olhada em cada um dos contos, procurando ser sincero sem desestimular os autores novatos, já que todos têm o mérito de aceitar um desafio desta monta e se posicionaram na rua principal ao entardecer para um duelo com a crítica.

O gigante, a curandeira e a lutadora de Kung-Fu - Alfer Medeiros

O pensamento que parece ter norteado Alfer Medeiros foi: “já que é pra misturar, então que se misture!” E até que a salada mista fluiu bem!

Oricvolver - Ghad Arddhu

Por outro lado, este conto tem alguns problemas de fluidez. O texto parece truncado e fragmentado. Alguns trechos podem melhorar se for dada a devida atenção à pontuação. Outros precisam de uma revisão mais refinada. Sugiro a Ghad Arddu uma releitura tentando se por no lugar do leitor. Ou talvez pedir a um leitor beta, com sinceridade suficiente para apontar falhas de forma objetiva.

Número 37 - Carolina Mancini

Uma mulher caçadora de recompensas chega à cidade. Enfrentará mais do que algum fora da lei.  Uma personagem feminina num universo masculino que chama a atenção dos homens de Cursed City, habituados a vê-las como prostitutas ou vítimas. Uma supresa os aguardará... e também aos leitores

Por um punhado de almas - Cirilo S. Lemos

Este conto retrata muito bem o espírito que norteou a coletânea. Uma boa mistura dos gêneros, desde o título. Excelente!

A balada do coyote - André Bozzetto Jr.

Um pistoleiro famoso é contratado para enfrentar um bando. Quando ele chega mais parece um músico covarde que alguém capaz de fazer mal a uma mosca. O que destaca o conto são suas referencias anacrônicas a músicas dos anos 70, cantadas pelo pretenso pistoleiro.

Just like Jesse James – Alliah

Outra mulher enfrentando um mundo masculino. Final digno de uma boa história de terror.

A mão esquerda da morte - Georgette Silen

Este conto parte de uma boa ideia, porém não totalmente aproveitada. A autora optou por trazer elementos do steampunk, entre eles uma arma poderosa, que acaba ofuscando justamente a mão esquerda da morte, que, no fundo, revela ter um poder pífio. A mão esquerda da morte deveria ser a estrela e não coadjuvante. Apesar deste defeito, o conto tem um bom desenvolvimento e diverte.

Deixe-me entrar - Verônica Freitas

Uma moça abandonada à própria sorte busca sua vingança. Uma boa história de terror.

Demônios da escuridão - Tânia Souza

Outra bem construída história de vingança.

Domingo, sangrento domingo - Romeu Martins

Uma criatura aprisionada busca seu caçador.  O autor busca contar isto de forma original, revertendo algumas expectativas.

Nem sempre a fé te salvará - M. D. Amado

“Quanto mais eu rezo, mais assombração aparece”. Um bom enredo.

Sally - Valentina Silva Ferreira

A autora é portuguesa e seu texto ás vezes causa a impressão de que é formal demais, sobretudo nos diálogos. O conto tem uma boa premissa e se desenvolve bem.

As desventuras do pequeno Roy - Jota Marques

Roy é um menino que sonha ser um pistoleiro, com o intuito de minimizar o trabalho de sua mãe no saloon. Mas algo está prestes a acontecer. A história tem um bom desenvolvimento e, principalmente um bom final.

Aquele que vendia vidas - Ana Cristina Rodrigues

Um mercador de escravos chega a Cursed City e é passado para trás por um rancheiro. Buscará vingança. Um texto bem escrito.

Duas lendas - Chico Pascoal

Um juiz enforcador chega a Cursed City. É preciso arrumar um “culpado” para que haja pelo menos um enforcamento. A história está bem escrita, mas com um pequeno deslize do autor. Ele nomeia um dos personagens como “o homem mais rico da cidade” e repete este epíteto toda vez que este personagem aparece, sublinhando em itálico. Seria mais interessante dar um nome, ou um cargo ou ambos e ir alternando. Temos um estereótipo (um dos vilões é o homem mais rico da cidade) e não precisamos sublinhar isso. O texto merecia um revisão para contornar este deslize, caso o conto venha a ser publicado novamente.

Ainda dói? - Davi M. Gonzales

Um homem com dor de dentes encontra alguém que se dispõe a arrancá-lo. O dentista improvisado conta histórias macabras para distrair o “cliente” enquanto prossegue com o “tratamento” dentário.

Spoiler:
A história é boa, mas convém levantar um ponto. O enredo está baseado em alienígenas. Tudo bem, porém os envolvidos, supostamente cowboys iletrados, usam o termo alienígena e tratam do tema como se isso fosse parte pelo menos do seu contexto imaginário, o que quebra verossimilhança (H. G. Wells colocará os alienígenas na imaginação popular apenas em 1898). E o autor perde a chance de tornar a história mais interessante: os cowboys não sabem o que são alienígenas, mas o leitor sabe. Em vez de usar a palavra alienígenas, por que não usar descrições toscas que levem o leitor a deduzir isto?

Só o dinheiro dos mortos - Yvis Tomazini

Um roubo a um banco. Normal, não fosse em Cursed City. Bom texto com algumas ideias interessantes. O final é um pouco atropelado. Poderia ser um pouquinho mais fluido.

O fantasma de Fraklin Stuart - Lucas Rocha

Um fantasma atormenta seu algoz. Bem escrita.

Descanse em paz - Zenon

Um homem desmemoriado chega a Cursed City. Coisas extraordinárias estão em seu passado. Uma bem conduzida história de mistério. O final surpresa valoriza o texto.

Sombras - Marcel Breton

Encerrando a coletânea, este conto se propõe a, justamente, dar um final para o livro, se bem que aberto. O apache Hodoken, em sua velhice, conta um episódio que dá uma explicação para pelo menos alguns dos fenômenos que ocorreram na cidade amaldiçoada.

Um bom texto para fechar a coletânea. Serviu também para dar mais profundidade a  Hodoken, arredondando o personagem.

O conto está em primeira pessoa, e dito de forma a denunciar a pouca familiaridade do índio com o idioma, porém está bem escrito demais para alguém nestas condições. Esta é a única falha, que poderia ser contornada com o índio falando com alguém que reproduz suas palavras de forma mais organizada ou o índio se revelando como alguém mais letrado do que fazia as pessoas suporem.




Um comentário:

  1. Gostei muito da resenha.
    Sou a autora de "Número 37" e sempre é legal ter comentários sobre algo do qual se faz parte, tantos os positivos quanto os nem tão positivos assim.
    Em particular, também agradeço.

    Vou passar por aqui mais vezes.

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