sexta-feira, 2 de julho de 2010

Os Melhores Contos Brasileiros de Ficção Científica – Fronteiras

Título: Os Melhores Contos Brasileiros de Ficção Científica – Fronteiras
Autor: Roberto de Souza Causo (org)
Editora: Devir – coleção Pulsar
186 páginas


Sinopse:  Nesta nova antologia, Roberto Causo traz contos de diversas épocas onde predomina a invasão de fronteiras entre gêneros ou entre o mainstream  e a ficção científica.

A partir do prefácio, Roberto Causo se posiciona claramente em relação às suas motivações. Segundo ele, na antologia anterior houve uma quase unanimidade da crítica em apontar o conto O Imortal de Machado de Assis como espúrio, como se a Ficção Científica não fosse digna do mestre (isso mesmo para críticos oriundos do fandom). O livro soa então como uma resposta a estas críticas .

Polêmica à parte, a seleção dos textos atinge plenamente o objetivo de mostrar trabalhos que realmente são limítrofes. Para situar o leitor  no tempo e no espaço, Causo coloca uma pequena introdução sobre o autor, sua época e o texto em questão.

Começa com o excelente A Nova Califórnia, de Lima Barreto, que com um humor caústico, critica ambição humana. Um alquimista, Flamel, chega à cidade de Tubiacanga com uma fórmula capaz de transformar ossos humanos em ouro. A partir deste fato, ocorre uma rápida transformação na pacata cidade. Causo o classifica como limítrofe com o horror, porém eu o considero mais para humor negro. Quando eu o li pela primeira vez (há bastante tempo),  tive  a impressão de que Flamel era um falso alquimista, que, ao tentar dar um golpe na cidade,  perdeu o controle da situação.  

A seguir temos A Vingança de Mendelejeff, de Berilo Neves, um conto catastrofista tendo como cenário o Rio de Janeiro, onde não falta nem a figura do cientista louco.  O uso de terminologia científica em desuso (como azoto no lugar de nitrogênio), mesmo para época em que foi escrito (1929), revela ou o autor estava mais preocupado com o enredo do que com o rigor, ou  que usava uma terminologia de fácil assimilação pelo leitor da época. De qualquer forma, um bom conto.

Delírio, de Afonso Schmidt, coloca pacientes de uma clínica em estado terminal tendo contato "com o outro lado da vida". Lembra muito escritos espíritas, como o livro Nosso Lar. Mas sem cair em pieguices ou no moralismo fácil.

André Carneiro, em O Homem que Hipnotizava, coloca um personagem que se autohipnotiza para colorir sua realidade, numa versão pós-moderna do "jogo do contente".  Como o personagem não era nenhuma Poliana, a coisa não deu tão certo.

Domingos Carvalho da Silva, nos traz em Sociedade Secreta, um grupo de velhos que se torna a única voz discordante de um sistema que torna todos felizes, dando a seus cidadãos tudo que querem, menos a liberdade. O grupo se reúne num esgoto e tem como companhia ratos, criaturas que o sistema supõe exterminados.

Jerônimo Monteiro comparece com o conto Um Braço na Quarta Dimensão. Neste conto, um homem simples desaparece sem motivos. André Carneiro aparece "numa ponta", ao ser citado por um dos personagens como capaz de pesquisar o problema.

Numero transcendental, de Rubens Teixeira Scavone, traz um tema bastante freqüente em sua literatura: avistamento de Ovnis (ou UFOs). Um fugitivo de um hospital psiquiátrico encontra com seres estranhos (serão parte de sua alucinação, ou serão reais?).

Em Seminários dos Ratos, Lygia Fagundes Teles Faz uma metáfora regada por um humor corrosivo da ação da burocracia tecnocrata dos tempos da ditadura de 64. Uma reunião em Brasília tenta dar uma solução para praga de ratos que assola o país. Mas as pessoas discutem detalhes frívolos sem perceber que o problema está cada vez mais próximo.

Contato com seres extraterrestres também é o tema de O Visitante. Neste conto de Marien Calixte, uma mulher recebe a visita de um ser extremamente belo. A narrativa é levemente erótica e bastante poética.

Jorge Luiz Calife comparece com o conto Uma Semana na Vida de Fernando Alonso Filho. Um homem vivendo em condições muito adversas no planta Venus sonha em voltar à Terra. A chuva interminável e angustiante lembra o conto A Grande Chuva de Ray Bradbury (presente no Homem Ilustrado), embora Calife concentre-se mais na psicologia do personagem principal que na opressão do clima.

Em Mestre de Armas, de Bráulio Tavares, um candidato Mestre-de-armas treina um grupo de seres humanos e humanóides para poderem lutar contra uma raça inimiga. Bráulio Tavares ironiza os discursos militares motivadores, que mascaram estupidez da guerra.

Dono de um estilo único, Ivan Carlos Regina, em O Fruto Maduro da Civilização, nos traz uma imagem distópica do futuro, nos fazendo questionar se o que fazemos realmente é progresso.

Uma boa mistura de Ficção Científica, Policial e Horror é encontrada no conto Engaiolado, Cid Fernandes. Num angustiante caso de abdução, onde um homem simples é perseguido por um objeto que ele mesmo chama de "demo".

Fechando o livro, o conto Controlador de Leonardo Nahoum, um ser super poderosos tornar-se apenas um guardião de um planeta e usa seus poderes apenas para fornecer o que os "clientes contrataram". Mas será que ele vai ficar apenas nisso?

Causo fez na realidade uma demonstração de sua tese, proposta no prefácio: há mais coisas em comum entre os vários gêneros e a Ficção Científica do que normalmente se supõe.

Quod erat demonstratum.

Nerd Shop


5 comentários:

  1. Resenha instigante!

    Esse livro tá na lista de próximas compras, com certeza. =)

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Muito interessante a resenha, já fiquei interessada pelo livro. Gosto de ficção científica, contos, lendas, etc. Parabéns pelo blog, já estou seguindo. Tenho um blog de contos, "causos" http://mundonaoreal.blogspot.com.br/. Abraços

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